Como foi pra você o ano que está quase terminando?
Faltando poucos dias para terminar o ano, não há como escapar desta pergunta. Mesmo que a gente não queira falar em voz alta ela fica lá, escondidinha clamando por uma resposta.
Como uma boa menina que sou devo responder que graças a Deus passei com saúde, meus filhos também, e que mais uma vez graças a Deus, novamente, meu casamento sobreviveu. Não sei até quando, e nem sei se devo comemorar, ainda não tenho uma opinião formada sobre este fato.
Almocei todos os dias, jantei, comi muitas frutas, bebi muita água, vi o mar, senti o sol em meu rosto, com protetor solar claro, vi a chuva, e sobre os estragos que ela fez, e tem feito, prefiro não comentar, afinal ela veio do céu.
Assisti na tv algumas coisas que ainda gosto, inclusive eu falando do meu Gato Romeu.
Tirando alguns poucos dias fora do ar usei e abusei do meu computador, passeei muito pela net, suguei tudo que ela tem de bom.
Fiz amigos, alguns inimigos que não tive como evitar, descobri coisas, aprendi, li alguns livros maravilhosos, conheci pessoas lindas, fui ao cinema, fiz escova, pintei as unhas, em alguns momentos de coragem, pintei de vermelho.
Telefonei sempre que quis, para quem eu quis, chorei poucas vezes, mais de emoção do que de tristeza.
Sem nenhuma pretensão, ajudei algumas pessoas, fui em todas as festinhas na escola das crianças, mesmo aquelas domingo à tarde.
Não resisti a algumas frituras, comi a gordurinha da picanha sem culpa, algumas poucas vezes.
Tomei algumas doses de vodka, tomei muita coca cola, escutei muita música, inclusive aquelas que algumas pessoas insistem em dizer que são bregas, mas eu adoro, e assumo que adoro, e me sinto muito bem em ouvi-las.
Segui algumas regras, outras não.
Costurei, bordei, criei e inventei.
Escrevi muito, usei as palavras pra dizer o que sinto, e o que acho, me dei esse direito.
Ainda não mudei de casa, mas mudei de opinião sobre algumas pessoas e sobre algumas questões.
Falei sempre que tive vontade, e não me calei diante de opiniões contrárias as minhas.
Participei de alguns eventos.
Fui feliz, amei do meu jeito, quase não fiquei sem jeito.
Meu filho João passou de ano, quando eu achava que isso não era mais possível, minha Maria continua cada vez mais linda, acho que meu Marido não me quer mais, mas ainda me olha, mesmo não assumindo isso.
Em 2008 não me faltou o básico, tive até um pouco além.
Como podem perceber esforcei-me para lembrar só das coisas boas, porque se eu não fosse uma boa menina, ia dizer que o ano de 2008 foi foda.
Ia dizer que eu sobrevivi a ele.
Vi tanta coisa triste, que acabei ficando triste também.
Assistir tv está ficando cada vez mais difícil.
Lembro-me como se fosse hoje da primeira tv, preto e branco, que meu pai comprou e que foi motivo de muito orgulho.
Hoje elas estão aí, cada vez maiores, transformando salas de visita em salas de cinema, impedindo cada vez mais o diálogo nas famílias.
Eu sei que alguém vai dizer que existe controle, e que existe a opção de não ver, mas eu vi.
Meus filhos cresceram e já não posso mais coloca-los pra dormir às 8 da noite.
Eles ficam, e eu acabo ficando também para ver o que eles assistem, por comodismo, por curiosidade... Enfim.
Assistir ao Jornal Nacional algumas vezes foi o dever de casa do meu filho, acreditem.
É preciso estar informada, infelizmente sobre tudo, e aí a gente vai levando, e assistindo, até pra mostrar pra nossos filhos o que eles não devem fazer, ou o que acontece com quem insiste em fazer o que não deve.
Nas novelas matar alguém é simples como fazer um lanche, fazer sexo quase explícito, levar os namorados para dormir em casa, ”ficar”como dizem por aí, brigas, traições, mulheres cada vez mais desvalorizadas, apanhando e se submetendo a machistas nojentos que usam e abusam de um poder que eles não tem, mas que algum dia alguém permitiu que eles tivessem... São cenas normais, e infelizmente presente na maioria das novelas, filmes e seriados.
Tem também as gostosinhas que tem sempre lugar garantido na mídia, ou as que se tornam gostosinhas para não perder o lugar, que fazem qualquer negócio por um peito maior, uma bundinha mais empinada, ou um apartamento de cobertura, e vão continuar fazendo por dinheiro, e enquanto houver pessoas que valorizam somente a aparência.
De vez em quando a gente lê ou vê uma triste notícia e fica sem entender como aquela artista, que desempenhou tão bem o seu papel, de repente foi esquecida, colocada de lado, algumas porque envelheceram, outras porque não são Glórias, não se sabe bem porque, não conseguiram um lugar ao sol, ou melhor, dizendo, um lugar na globo. E depois de reclamarem seus direitos em programas sensacionalistas, sem obter nenhum sucesso, a não ser aumentar o ibope de canais de televisão quase falidos, viram vendedoras de coco na praia, ou em alguns casos, quando ainda não envelheceram e quando ainda não se deprimiram por inteiro, optam por um filme pornô, nada contra, apesar de achar que enquanto existirem mulheres usando o corpo para ganhar dinheiro, vão existir homens humilhando, desmerecendo e batendo na cara de algumas delas.
Mas em contra partida existem Fernandas...Maitês, Marietas, Deboras, Glórias, Lyas e tantas outras não tão famosas, mas igualmente competentes, que conseguem mostrar que podemos e somos muito mais do que um belo peito comprado, e que estrias e celulites, não nos impedem de pensar.
Políticos corruptos já nem nos incomodam tanto, ouvir dizer que um deles roubou, enganou, ou se apossou do dinheiro alheio, tornou-se tão normal e presente como a moça do tempo, aquela moça linda, que nos diz todos os dias debaixo do seu terninho comportado e impecável, se vai chover ou fazer sol, e se quase sempre ela erra, não é culpa dela, afinal ela é linda, e só fala o que mandam ela falar, infelizmente.
Artista famosa...Fazendo propaganda de fogão e geladeira...É de doer...
Fiquei pensando como uma boa menina que pensa, o que a agência de propaganda pretendia, será que eles quiseram imitar concessionárias de veículos, que colocam mulheres lindíssimas, com seus vestidos minúsculos diante de carros caríssimos, atraindo homens que ficam ali por alguns poucos minutos, fantasiando, que ao comprar o carro à mulher irá junto?
Será que eles acham que somos tão burras a ponto de acreditar que aquele sabão em pó famoso, limpa mesmo todas aquelas blusas sujas de bolo de chocolate e tinta, daquelas crianças, que brincam livremente, em um gramado verde e bem tratado, gozando de uma liberdade que só existe nos comerciais de tv?
Claro que não limpa, o que limpa mesmo é aquele líquido milagroso, da garrafinha verde de plástico, não é à toa que as escolinhas não abrem mão do aventalzinho por cima da blusa de uniforme, nas aulas de arte.
Claro que não seremos atraídas a comprar um eletrodoméstico, só porque a artista da Globo está lá.
Queremos uma máquina de lavar que nos entregue a roupa lavada e passada, que talvez com um ima atraia as roupas sujas pra dentro dela.
Queremos um fogão mágico, que faça arroz soltinho, e carne macia, porque precisamos de tempo, para fazermos algo que gostamos, seja lá o que for.
Queremos verdade.
Chega de crianças lindas, loiras, olhos azuis, e no meio delas uma negra apenas, igualmente linda, sendo usada para forçar uma barra, porque infelizmente o racismo esta aí, brotando por todos os cantos do mundo.
Que venha o nosso querido Obama, que ele salve, não só os Estados Unidos, mas que salve o mundo do preconceito.
Que negros lindos, como o Didu da novela das oito, como o nosso querido Lázaro Ramos, como a maravilhosa Thaís Araújo, e tantos outros, nos façam ver que o mundo é de todos, que a cor da pele é só um detalhe, e, diga-se de passagem, na minha opinião, um belíssimo detalhe.
Chega de negros lindos fazendo papel de escravos, de mordomos, de motoristas, como se eles não amassem, ou não soubessem amar.
Como se eles não pudessem beijar, e serem beijados, mesmo que fossem beijos técnicos, e como se não causassem suspiros.
Por mais que falem mal, o nosso querido Silvio Santos, com o seu eterno quadro ”Qual é a música” e o Fausto Silva, como seu programa, sem compromisso, quase bobinho, apresentando cantores que sempre vendem dois milhões de cópias, ainda nos permitem sentar no sofá da sala, com as crianças, sem ficarmos constrangidos, com as bochechas coradas, diante de cenas que até outro dia, a gente só podia imaginar.
Como eu sou uma boa menina, nem vou falar de como foi difícil assistir todos os dias, notícias de pessoas morrendo sem querer, com balas perdidas, policias que deveriam nos defender envolvidos e pedindo desculpas, por enganos cometidos, enganos esses, que matam crianças, como João Roberto, que mesmo tendo obedecido ao pedido da mãe desesperada, e se abaixado, não escapou do lamentável engano de um soldado, despreparado, mal informado, sobre como se proceder quando estiver diante de seres humanos, e principalmente diante de crianças inocentes.
Soldados que não se contentam com um tiro apenas, disparam vários, nos dando impressão de estarem usando aquele momento para extravasarem todas as suas frustrações.
Até hoje não consigo entender e não tenho como evitar julgar como monstros, pessoas que jogam uma criança pela janela, apesar de ter aprendido no catecismo, na igreja perto da minha casa, quando eu era criança, que não devemos julgar.
Mais triste ainda é ver que caiu no esquecimento a morte de uma adolescente que morreu, ainda não se sabe direito quem matou, não sabemos se ela morreu na mão de um jovem apaixonado, e descontrolado, se morreu por incompetência da polícia mais uma vez despreparada para enfrentar situações que infelizmente estão virando rotina, ou se foi para castigar o pai por erros cometidos no passado, e que foi igualmente esquecido.
Poderia ficar aqui horas falando de um monte de horrores que vi em 2008, mas como sou uma boa menina, vou tentar esquecer tudo isso, vou pedir aos céus que faça um milagre, que não permita que pessoas morram por nada, morram a toa.
Vou pedir aos céus paz pro mundo.
Que sejamos mais solidários, mais amigos, mais compreensivos.
E claro vou fazer um pedido especial para nós mulheres...
Que a gente consiga cada vez mais conquistar o nosso espaço.
Que a gente consiga ser respeitada.
Que o nosso trabalho seja chamado de trabalho.
Que a responsabilidade de educar e formar o caráter de nossos filhos, não seja só nossa.
Que no mesmo lugar onde estão escritas todas as nossas obrigações, estejam também escritos os nossos direitos.
Como sou uma boa menina,
Desejo de verdade, de coração, que a tv mostre mais nini séries de escritores como Machado de Assis, documentários do nosso Brasil maravilhoso, piadas verdadeiramente engraçadas, que nos fazem rir sem compromisso e sem constrangimento.
Programas como a grande família, que além de artistas maravilhosos, nos mostram apesar de toda a confusão, que família ainda é muito importante.
Enfim que a gente consiga desligar não só a tv, na hora de coisas horríveis, mas que a gente consiga desligar de nossas vidas tudo que não for saudável.
Um 2009 lindo ligado somente em coisas boas.
Feliz Ano Novo!
Carla Pianchão