Oi Ana! - Eu disse ao entrar na floricultura perto da minha
casa.
Na verdade fui ao sacolão, e pra falar mais verdade ainda,
fui pagar uma conta.
Bom, já nem lembro o que eu fiz primeiro, mas é sempre
assim, parece que sou atraída para dentro das floriculturas e quando assusto já estou lá me deliciando com o cheiro de
terra molhada e tentando entender porque todas aquelas pessoas não estavam
radiantes. Afinal sempre achei que
trabalhar com terra, flores de todos os tipos, é como ganhar na loteria. Acha
que estou exagerando, levando em conta a minha paixão pela natureza? Então tá,
digamos que poder trabalhar com flores seja como ganhar na loteria junto com doze
ou dezessete pessoas, mas essa é outra
história.
-Eu queria um vasinho de barro, por favor.
- Um minutinho que vou pegar, e lá se foi a Ana por entre as
flores (compro sempre com ela por me parecer a mais leve), e realmente um minutinho depois,
lá vem ela com um vaso de barro em cada mão, um mais rebuscado que o outro,
envernizado...
Por se tratar da Ana, a moça leve, escolhi bem as palavras:
- Eu queria algo mais rústico (eu queria mesmo era um vaso
velho, tipo aqueles esquecidos em um canto qualquer, na casa de uma vó já
cansada), sem verniz...
- Ah que pena, lamentou Ana, não temos assim como está
querendo.
Eu não queria duvidar, porque era a Ana, a moça leve. Então não tive outra escolha. Inconformada,
me despedi e fui saindo com uma certezinha de que ainda não estava tudo perdido,
e não estava mesmo. Avistei o tal vaso, jogado de boca pra baixo sem nada
plantado, velho e esquecido, só não sei se por uma vó cansada.
- E aquele ali? -Perguntei com os olhos de quem avistou um
socorro, quando tudo parecia perdido.
- Esse aqui?- Perguntou Ana quase não acreditando que era
aquele.
-Está a venda?- Perguntei, e antes mesmo de ouvir a
resposta, fui logo dizendo:
-Quero ele, qual o preço?
Ainda sem acreditar,
Ana, a moça leve, recolheu o vaso
abandonado de cima da terra, e foi tentando limpá-lo e retirar o lodo que já se
formara, quando eu disse:
- Não precisa limpar, eu gosto assim.
Ela me olhou tentando disfarçar o espanto e pensando o que
teria me levado à loucura.
Eu fiquei tão encantada, que ali mesmo pedi que ela plantasse
uma gorduchinha (suculenta) e fui embora maravilhada com a arte que a natureza
fez no vaso abandonado. E a moça leve da
floricultura, a tal Ana, me acompanhou até o portão, talvez para se certificar
de que eu estava mesmo sozinha como uma senhora “normal”, ou se não havia um
enfermeiro na porta esperando para me levar embora.
Nenhum julgamento ou pensamento da moça leve me impediu de
caminhar pela rua, de volta pra casa, alegre e feliz, como uma criança que
acabou de ganhar um doce, segurando cuidadosamente meu vaso de barro, velho, abandonado e manchado de lodo.
Pois é, depois de vários dias, abandonado e esquecido,
continuo sem saber se por uma vó cansada, o velho vaso de barro ganha um lugar
de destaque.
Todas as manhãs, ao
chegar em meu cantinho, para mais um dia
de trabalho, lá esta ele, me esperando, e que Ana, a moça leve, não me ouça, mas acho que ele estava me
esperando na floricultura também.
Carla Pianchão
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